Conciliar carreira e maternidade é um desafio para as mulheres, sobretudo, se a mulher não tiver o apoio de um(a) companheiro(a). A sobrecarga emocional e de trabalho acaba recaindo sobre elas de forma desproporcional.
Muitas chegam até a pedir demissão, enquanto outras perdem o emprego após se tornarem mães. A Época publicou uma matéria sobre uma pesquisa que mostrou que, no momento da licença, todas as mulheres estavam empregadas, mas, terminado o fim do período de estabilidade (quinto mês após o parto), a vida delas começa a mudar: 5% já não trabalham mais. No sexto mês, 15% das mulheres estão desempregadas. E, ao fim de 12 meses após o início da licença maternidade, 48% das trabalhadoras já não ocupam os seus postos de trabalho.
Ciente e consciente dessa realidade feminina, a Universidade Federal Fluminense (UFF) publicou um EDITAL que inclui um critério inédito de pontuação a fim de tornar mais equilibrada a concorrência entre homens e mulheres por bolsas de iniciação científica na instituição.
No concurso, as professoras que foram mães nos últimos dois anos terão cinco pontos a mais (se não atingirem a pontuação máxima), no intuito de compensar o tempo de licença-maternidade, durante o qual elas tiveram que interromper a sua produção acadêmica. Além de mães, o critério vale para pais adotivos e casais homoafetivos que tiraram licença para cuidar dos filhos.
É a primeira vez que esse tipo de critério, que visa a pensar na a questão de gênero e de constituição familiar, é adotado em um edital no Brasil. O concurso provê vagas do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (Pibic) de 2019, que seleciona alunos de graduação para desenvolverem um projeto de pesquisa, em troca de uma bolsa.
A professora Márcia Barbosa, do Instituto de Física da UFRGS e diretora da Academia Brasileira de Ciências (ABC), falou para o Globo que:
“Quando a mulher tira licença-maternidade, ela fica sem produzir e acaba ficando para trás nos editais. Isso que a UFF fez é muito novo. Há, no país, um movimento nacional neste sentindo e estamos começando a ter agora algumas iniciativas que olham a maternidade”.
O grupo Mulheres da Ciência, vinculado à Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-graduação e Inovação da UFF desde 2018, foi responsável pela criação do critério, que busca estimular a participação das mulheres na ciência – uma área, ainda, majoritariamente masculina. O grupo também atua em discussões sobre apoio para pesquisadoras que são mães, a fim de garantir a igualdade de oportunidades entre os acadêmicos da universidade.
O coordenador de Pesquisa, Walter Lilenbaum, explica que a pontuação extra é o reconhecimento de um direito das profissionais que são mães:
“A sociedade compreende que as mulheres têm a licença-maternidade e elas se afastam do trabalho. Isso leva a uma queda na produção científica. Não podemos permitir que elas sejam penalizadas. Essa é uma forma de compensar pelo período em que estiveram cuidando dos bebês”.
O edital Pibic 2019 exige que a docente apresente um documento atestando que esteve em licença-maternidade nos últimos dois anos para receber os cinco pontos extras na avaliação curricular, caso não atinja a pontuação máxima.
A professora do Instituto Biomédico e coordenadora do GT Mulheres na Ciência, Letícia de Oliveira, elogiou a iniciativa da UFF:
“Há trabalhos que mostram que a maternidade promove uma queda na produtividade das cientistas mães por, no mínimo, quatro anos. É muito importante que medidas de compensação sejam implementadas”.
Outra docente que avaliou positivamente a medida foi Thaiane Oliveira, do curso de Estudos de Mídia.
“Como pesquisadora e mãe de três filhas, me perguntam: ‘como é que você dá conta de tudo?’. Eu respondo: ‘a gente não dá conta de tudo, a gente tenta fazer o melhor possível para dar conta, mas no final do dia sempre fica carregando a culpa de que poderia ter feito um pouco melhor, colocado o filho para dormir naquela noite ou se dedicado mais a um artigo‘”, questiona.
Ela ainda acrescente que vê
“esse edital como um grande exemplo para diminuir as desigualdades de gênero na ciência, reconhecendo essas dificuldades e os desafios que são colocados para nós, mães, mulheres e pesquisadoras. Essa é a universidade pública que a gente deseja, que reconhece o direito das mães pesquisadoras e pela qual a gente quer continuar lutando”.
Parabéns à UFF, por reconhecer um dos trabalhos mais importantes e, muitas vezes, pouco valorizado socialmente: ser mãe e pai.
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Categorias: Trabalho e Escritório, Viver
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