Não demita: o tipo de empresário que o Brasil precisa ter


O que é uma pessoa bem-sucedida para você? Qual é a imagem que você tem dela?

Um homem, branco, heterossexual, vestido de terno, com a barba feita e um belo carro importado? Certamente, é essa imagem que povoa a mente de muita gente ao pensar em alguém que teve êxito profissional. E em relação ao caráter e as atitudes?

Esse pequeno exercício é uma forma de chamar a atenção para os valores que muitos brasileiros acreditam estar associados a empresários que tiveram sucesso profissional. Mas, em momentos de crise, como os que estamos vivendo, como os bem-sucedidos respondem? Com solidariedade e pensando em construir saídas coletivas ou usufruindo dos seus ganhos sem pensar em mais ninguém?

Salvar a economia ou salvar vidas?

Vários empresários brasileiros demitiram funcionários, chantagearam políticos e fizeram vídeos públicos no quais afirmaram que salvar a economia é mais importante do que salvar vidas. Os críticos indagaram: salvar qual economia, a sua própria?

Não há como salvar a economia de um país se os seus habitantes estão morrendo ou sendo vítimas de desigualdades sociais. Sendo assim, a única forma de lidar, do ponto de vista econômico, com a crise é pensar em alternativas que garantam a segurança sanitária de todos ao mesmo tempo em que os mais vulneráveis sejam assistidos e tenham garantias mínimas de sobrevivência.

“Não Demita”

Um grupo de empresários, liderado por Daniel Castanho, presidente do Ânima Educação, lançou a campanha “Não Demita” para combater o pensamento mesquinho de alguns colegas que não estão pensando sequer no mundo pós-pandemia, porque estão preocupados demais em salvaguardar o seu dinheiro no curto prazo.

Para Castanho, empresas que pensam assim não existirão num futuro próximo. E foi com esse argumento que ele conquistou o apoio de cerca de 1 mil empresas signatárias que firmaram o compromisso de não demitir nenhum funcionário até o final de maio.

“Nossa maior responsabilidade, agora, é manter nosso quadro de funcionários”, diz o texto.

Em entrevista para a BBC News Brasil, Castanho disse que neste momento é preciso cumprir a medida de isolamento social, para evitar que o novo coronavírus se espalhe ainda mais e cause mais prejuízos econômicos. O empresário defende que não é hora de pensar em agir no curto prazo, e sim de ter uma visão holística sobre o fenômeno.

Os efeitos econômicos da pandemia afetarão todo o mundo e cada país terá que encontrar a melhor maneira de dirimi-los ao mesmo tempo em que salva vidas. Castanho destaca que os empresários signatários revelaram um amadurecimento de não pensar mais neste trimestre, mas sim no que vai acontecer com o Brasil após o coronavírus.

Outro grupo empresarial que tomou medidas para não demitir os seus funcionários é o Magazine Luiza. A proprietária, Luzia Helena Trajano, reafirma o compromisso da empresa com a coletividade para lidar com a epidemia e que a saúde e o empregos dos funcionários são prioritários.

Os conselhos de Luzia Trajano do Magazine Luiza

Para a revista Exame, Trajano deu alguns conselhos para outros empresários, os quais ela vem seguindo em sua trajetória empresarial. Confira, a seguir, alguns deles:

  1. “O que mais a vida me ensinou é a me adaptar. Você tem que se adaptar, não adianta chorar o leite que já derramou”.
  2. Depois da saúde, é o emprego – mas é a primeira vez que estamos lidando com a saúde. A gente tem que entender que a saúde está em primeiro lugar”.
  3. “Vamos trabalhar para ninguém passar fome. Com fome, ninguém faz nada na vida. Você é do tamanho daquilo que você compartilha”.
  4. “Precisamos compreender o outro. Não é só pensar no financeiro, que é importante também, porque tem que ganhar dinheiro. Mas não podemos perder o propósito, senão fica vazio”.
  5. “Pense primeiro nas pequenas empresas, elas que fazem emprego no país”.
  6. “Você tem que buscar a solução. Eu não conheço nenhum empreendedor que cresceu só reclamando”.
  7. “O digital é muito mais fácil – ele veio para facilitar, não para atrapalhar. Ele veio para facilitar a vida das empresas”.
  8. “Duas coisas vão fazer diferença: o conhecimento e o fazer acontecer”.
  9. “Eu começo fazendo, depois eu entendo o que estou fazendo e transformo em projeto. Primeiro faço o necessário, depois o possível, e depois o impossível.”
  10. “Olhe para dentro e peça calma, estude bem as medidas que o governo está tomando, você não vai ter que pagar tudo que você teria pagar, para você não gerar desemprego nesse primeiro momento. É o grande momento de você fazer o que é necessário. Crie alguma coisa nova, renove”.

O ecossistema empresarial

Na fala de ambos os empresários, o empreendedorismo não é uma qualidade estática e isolada; ele acompanha o social, ou seja, a sociedade no qual ele se realiza e atende. Qualquer negócio é feito de pessoas e para pessoas, e o “sucesso” dele depende dos trabalhadores e dos consumidores – toda uma rede que não é feita de números, mas de gente de carne e osso.

Um empresário ou uma empresária bem-sucedidos estão muito longe daquela figura desencarnada do começo do texto. Esse profissional é parte de uma coletividade para quem trabalha e que, também, trabalha para e com ele.

Se alguém deseja empreender pensando exclusivamente em quanto vai lucrar, deslocado de qualquer responsabilidade social e ambiental, terá vida curta no mundo pós-pandemia. Não é desse tipo de profissional que o Brasil (e o mundo) precisa.

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Gisella Meneguelli

É doutora em Estudos de Linguagem, já foi professora de português e espanhol, adora ler e escrever, interessa-se pela temática ambiental e, por isso, escreve para o greenMe desde 2015.


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