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Você não está sozinho se se sente sozinho nesse mundo individualista e competitivo. A depressão é a doença do século XXI. Entenda!
O psicanalista Cristian Dunker, que é também professor titular do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP), é um dos especialistas brasileiros mais renomados quando se fala de depressão. Ele acaba de publicar o livro “Uma biografia da depressão”, no qual faz uma radiografia do transtorno que mais adoece pessoas no mundo todo.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), mais de 300 milhões de pessoas convivem com a depressão, que aumentou em 18% de 2005 a 2015. O que vem fazendo esse transtorno mental tornar-se a doença do século XXI?
Para entender esse fenômeno, a BBC entrevistou Dunker, que explicou que a depressão, historicamente, tem recebido diferentes interpretações. Mas, nas últimas quatro décadas, o nosso sistema de desejos e escolhas passou para um outro registro.
Especialista em sofrimento no neoliberalismo, Dunker argumenta que as narrativas sobre a depressão e ansiedade ganharam novos formatos, fazendo com que o sujeito sofredor assuma: “eu sou um depressivo”.
A depressão é o sofrimento mental da nossa época. Essa escolha está amparada na história, ao longo da qual vários transtornos mentais tiveram o seu “momento de glória”, como a histeria, a hipocondria e a melancolia.
Segundo o psicanalista, a palavra “depressão” foi eleita, desde os anos 1970, por ser um tipo de sofrimento no qual o conflito, que sempre pressupõe um outro, não aparece, mas sim a intensidade dos nossos afetos e das nossas motivações.
O diagnóstico de depressão serviu muito bem ao novo momento em que todas as responsabilidades recaem sobre o indivíduo, sintoma do capitalismo neoliberal. A partir desse momento histórico, as pessoas começaram a administrar as suas vidas como se fossem uma empresa, estabelecendo metas, medindo resultados e fazendo avaliações.
A ideia de que não há limites (“no limits”), nem mesmo para a felicidade, difundida na década de 1970, passou a ser uma idealização perigosa, sobretudo, porque foi atrelada ao consumismo.
Os depressivos, então, são aqueles que se mostram como habitantes de outro tempo, no qual a produtividade não é o índice que mede as suas vidas. Nesse sentido, aqueles acometidos pela depressão são uma espécie de outsiders do sistema capitalista.
A psicanalista Maria Rita Kehl, em seu livro “O tempo e o cão”, defende que o aumento contemporâneo dos casos de depressão é um sintoma social que ocupa o lugar daquilo que Sigmund Freud havia sinalizado como o “mal-estar da civilização”.
Sobre tal aspecto, os dois psicanalistas brasileiros parecem entender que os sujeitos depressivos são mal adaptados ao século XXI, cujos valores são a velocidade, a instantaneidade, o individualismo, o consumismo, o exibicionismo e a acumulação.
Outro ponto levantado por Dunker é que algumas teorias menosprezam o conflito, como se a sua instauração fosse um sinal de incompetência de quem não sabe gerenciar e organizar a vida.
Entretanto, essa lógica nada tem a ver com a vida. Basta pensarmos no momento atual que aflige todo o mundo: a pandemia de Covid-19, que é o maior conflito do século XXI, balançou todas as certezas, entre elas, a do “foco no resultado”.
Ficou evidente que ninguém fracassa sozinho ou porque quer.
Dunker também analisa a depressão e a ansiedade como dois lados de uma mesma moeda:
“Provavelmente a depressão e a ansiedade são uma coisa só. São partes de um mesmo processo em que você tem sujeitos que estão mais próximos de um polo ou de outro, mas a grande maioria trafega entre ‘eu me aproximo do desejo, isso me dá uma crise de ansiedade’ e ‘eu recuo do desejo e daí faço uma crise depressiva’. Pra sair da depressão, eu volto para a ansiedade”.
Contudo, essa gangorra de emoções foi separada pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, que é uma sistema de classificação utilizado pela psiquiatria. Esse manual assume uma estrutura de lista, na qual as causas da ansiedade ou da depressão não são levadas em conta em um diagnóstico, e sim os sintomas.
Em relação a pesquisas sobre o aumento de casos de depressão no Brasil durante a pandemia, Dunker conta que, na clínica, isso não foi notado expressivamente, a não ser de forma pontual entre, por exemplo, profissionais que têm trabalhado diretamente com a pandemia.
Parece que houve um equilíbrio, como sugerem algumas pesquisas, pois os deprimidos foram protegidos pelo isolamento social, já que o mundo desacelerado ficou mais próximo do tempo deles.
Em “A biografia da depressão”, o nascimento do transtorno remonta à crise de 1929, pondo em evidência a relação entre graves crises econômicas e saúde mental. Isso se confirmou na década de 1970 com o neoliberalismo, que foi imposto como uma lei geral.
Até que veio a crise de 2008, momento a partir do qual parece que passamos a nos dar conta, na visão de Dunker, da dimensão ética do sofrimento. Começou a ser posta em evidência que a lógica da imputação de sofrimento ao outro não pode ser mais justificável para o aumento dos níveis de produtividade infinitamente, algo que vem se mostrando não apenas improdutivo, como um problema ético socialmente.
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