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Don Juan é um personagem do imaginário popular espanhol que ficou muito famoso pela grande capacidade de seduzir mulheres, transformando-se numa lenda que inspirou o mundo das artes, através de livros, filmes, histórias, contos, peças teatrais e afins.
No Livro A história de Don Juan, de Alessandro Baricco, Don Juan é descrito como “um lendário rico e libertino que dedica a sua vida à sedução de mulheres, com uma vida pontuada por violência, jogos de azar e natureza hedonista.
No Wikipedia é descrito como “um mulherengo inveterado, que seduzia as mulheres disfarçando-se de seus amantes ou lhes prometendo o matrimônio”.
Ao longo dos séculos, a estória foi contada de várias formas, mas na maioria das vezes, Don Juan foi retratado como um homem que buscava em primeiro lugar, seu próprio prazer, através da conquista e do sexo.
Embora essa figura pontue a literatura e as artes em geral, acredita-se que a lenda foi inspirada num homem real. E como a arte imita a vida e a vida imita a arte, existiram e existem muitos Don Juans por aí.
Tanto isso é verdade, que a psicanálise criou o termo “Síndrome do Don Juan”, para esse tipo de comportamento. Pessoas insaciáveis que somente encontram prazer através de uma nova conquista, porque simplesmente não conseguem resistir, são movidas pela novidade, pela arte da sedução, do encontro e, tão logo alcançam o ser desejado, perdem o interesse, até surgir um novo objeto de desejo.
Por causa disso, não conseguem manter vínculos duradouros, a menos que seja um relacionamento aberto, ou, em caso de manter vínculo e a relação for monogâmica, à base da infidelidade. É impossível resistir, se resistem, sofrem.
A síndrome de Don Juan é naturalmente associada aos homens, mas pode certamente ocorrer com mulheres, inclusive, as mestras na arte da sedução são as mulheres, absolutamente associada à necessidade de exercer poder.
De fato, houve uma época em que uma das únicas armas das mulheres era a sedução, já que a elas era negado tudo, inclusive estudar ou trabalhar. E isso de alguma forma está arraigado.
Marcos Lacerda, psicólogo do Canal Nós da Questão, descreve a síndrome do Don Juan como aquela que acomete pessoas que são sedutoras compulsivas, seduzem por seduzir, porque surgiu a oportunidade, é como um vício, uma necessidade.
O vício está justamente na excitação do desejo, nesse coquetel de endorfinas que o corpo produz no início de qualquer relação de apaixonamento. E tem pessoas que não vivem sem esse sentimento, desse eterno apaixonamento, dessa paixão adolescente, do frio na barriga.
O Don Juan é, portanto, um viciado.
O problema é que, como qualquer vício, tem efeito curto e pode acabar na mesma velocidade que começou. Então, é preciso uma nova dose, uma nova conquista, uma nova paixão, mesmo que dure apenas uma noite, uma semana ou um mês.
Segundo Lacerda, os sedutores são espertos e sabem reconhecer exatamente a necessidade do outro e como atendê-las.
Sim, por isso são sedutores. São pessoas muito agradáveis, simpáticas e principalmente, sempre estão dispostas a dar e ter prazer. Eles sabem e conseguem ser exatamente o que o outro deseja. Eles conseguem se tornar o objeto do desejo do outro.
Isso é maravilhoso, não se pode negar. Mas se for simplesmente manipulação do desejo e sentimentos, pode ser que não seja tão fácil aceitar que o desejo de hoje será rapidamente trocado pelo novo desejo do amanhã.
E esse é o ponto. Normalmente não se fala a verdade. O outro geralmente é enganado ou se deixa enganar, acreditando nas promessas de amor ou de flerte que não são verdadeiras ou em sendo verdadeiras, não são duradouras.
Fazem parte da tática de sedução, e no final, levam o enganado a desenvolver um sentimento que não será correspondido e a decepção será inevitável.
Em muitos casos, inclusive, pode ser que o ato sexual nem seja o mais importante, o interesse é o cortejo, os olhares, o frio na barriga, a primeira mensagem, a troca de promessas, até a conquista final, quando o objeto do desejo, imediatamente perde o interesse. Pode ser através do sexo, pode ser ao perceber que o objeto do desejo está dominado, apaixonado, conquistado.
Os homens normalmente levam o desejo para o ato sexual mas, no caso de mulheres, tem aquelas que adoram seduzir somente para serem cortejadas, paparicadas, sem interesse sexual real. E quando o sinal é ultrapassado, logo saem de cena.
O donjuanismo é atribuído normalmente aos homens, mas pode acontecer com mulheres também. É comum que nas mulheres, as façam usar a sedução para serem mimadas no trabalho, por exemplo, receberem atenção especial, rapidez para resolver seus problemas, trazerem café com chocolate…
Para elas é importante saber que são desejadas, que seduzem todos por onde passam, sem ter que corresponder a esse afeto. Isso as faz se sentirem especiais e preenchem o vazio por traz de tamanha necessidade de demonstrar poder através do desejo.
Isso sem falar na validação do próprio ego. É ele dizendo o quanto a pessoa é sedutora, amada e desejada através do olhar do outro. Tem mulheres que não vivem sem despertar o desejo no outro e são capazes de tudo para isso, inclusive serem muito simpáticas, carinhosas e encantadoras, de propósito.
O sexo é o de menos para elas, não é o protótipo de mulher que gosta de sexo e tem vários parceiros. Não se trata de sexo, o que a excita, a necessidade desse tipo de sedutora é a de se sentir desejada por todos, e o que verdadeiramente lhe interessa, é o cortejo sentimental, a paixão dos primeiros dias. Uma vez que a consegue, quando tem a certeza de que esse alguém está disposto a tudo por seu amor, perde o interesse totalmente, porque de fato, nunca quis um relacionamento, apenas ser desejada.
Novamente, o problema é dos otários que são deixados pelo caminho. Perdidos, enganados com a falsa esperança que estavam sendo correspondidos em suas expectativas, quando, na realidade, estavam apenas lidando com o ego inflado de alguém, ou com a incapacidade de tanta gente em construir um amor estável e duradouro.
Para Freud, pai da psicanálise, o Don Juan está preso na fantasia edipiana de ser o alvo da paixão materna.
“É um homem emocionalmente imaturo, de perfil narcisista, que procura a figura da mãe em cada mulher que seduz. Quando consegue seu amor, não pode senão abandoná-la, fugir dessa relação que, para seu inconsciente, seria incestuosa”.
Já para Lacan, a situação é menos problemática do que o amor de édipo, trata-se de pessoas que são movidas pelo desejo, e o desejo é baseado no novo. O prazer assim, somente pode ser alcançado pelo novo. O problema é que sempre depois de desejo alcançado, vem um vazio, junto com tristeza e melancolia e a necessidade de preencher esse vazio, é o novo, e o novo, e o novo.
Segundo uma reportagem do jornal El Pais, para o psiquiatra e sexólogo Adrian Sapetti, o Don Juan nunca se apaixona, é impossível, não dá tempo. Ele pode até acreditar “estar apaixonado”, mas, depois da conquista esse sentimento não se fortalece. E pior,
“se a presa se mostrar indiferente ou o rejeitar, o sedutor insatisfeito, valendo-se de todas as suas artimanhas, persiste até conquistá-la. Trata-se, portanto, de um sentimento muito primário, carente de profundidade”.
Manuel de Juan Espinosa, professor de Psicologia da Universidade Autônoma de Madri e especialista nos mecanismos do amor, acredita que os Don Juans sentem, de fato, um tipo de amor real, mas pelo ato do apaixonamento, pela cena e não pela pessoa.
“É uma espécie de sentimento que estoura feito rojão; essas pessoas da mesma forma que sentem uma euforia sofrem um baque.”
Segundo o psicólogo Lacerda, por causa dessa fragilidade e insuficiência emocional dos sedutores compulsivos, eles desenvolvem alguns comportamentos que podem identificar esse tipo de pessoa imatura, saiba reconhecer:
Se acaso decidirem por razões outras (imposição social, velhice, incapacidade de continuar seduzindo com regularidade, medo da morte e tantos outros) manterem um compromisso, o destino será o da infidelidade, ou infelicidade.
Como sinal de amadurecimento, poderiam funcionar num relacionamento aberto ou amor livre. Ressaltando que, no caso da síndrome do Don Juan, essas pessoas têm enorme dificuldade de amar e manter vínculo, movidas apenas pelo desejo. São muito voláteis, os sentimentos não se sustentam com o tempo, porque o que os move é o desejo.
Podemos pensar que seria melhor e mais fácil o Don Juan simplesmente falar a verdade e procurar um parceiro que aceite um relacionamento aberto ou formas de amor livre.
Mas talvez não seja esse o problema de quem sofre com essa síndrome, talvez o problema esteja justamente na pessoa utilizar de “artifícios” de sedução que não são pautados na ética, na verdade e no respeito. Ao contrário, essas pessoas brincam com os sentimentos das outras somente em busca do prazer. Responsabilidade afetiva não existe para os Don Juans.
A Síndrome do Don Juan não é portanto somente uma questão de incompatibilidade com a monogamia, vai muito além disso. Para os especialistas, esta pode ser considerada uma patologia.
O Don Juan não pode ser verdadeiro, ele é um sedutor compulsivo que precisa mentir, criar cenários para obter o objeto do desejo. Como um verdadeiro narcísico precisa ser validado e reconhecido pelo outro. O Don Juan precisa despertar o desejo, o amor e o interesse da pessoa desejada, só assim é afetado pelo prazer procurado.
Não se trata de sexo, vai muito além do que isso!
Mas em tempos atuais, ainda cabe esse tipo de perfil egoísta e egocêntrico?
Mulherengo barato, que busca apenas a conquista e o sexo.
Esse tipo de cara está cada vez mais fora de moda.
Algumas pessoas podem até ingenuamente acreditar na conversa, no bom papo ou até na boa aparência de um sedutor, mas logo que percebem a cilada, a grande maioria, para muito além da decepção, acreditam que foi um livramento.
As mulheres atualmente estão muito mais esclarecidas, exigentes, conscientes de seus corpos e desejos e, mesmo que seja apenas para suprir carência, não estão mais dispostas a aturar esse tipo de comportamento.
É desnecessário. É feio. É antiético. Os padrões de comportamento e relacionamento estão mudando, as pessoas estão mais abertas a novos tipos de relacionamento e não aceitam mais ser enganadas, com juras de amor eterno e pedidos de casamento para, se quiserem, terem uma boa noite de sexo.
Isso pode ser conversado naturalmente sem necessariamente envolver sentimento de amor ou mentiras estratégicas.
A figura do cruel sedutor que busca apenas a conquista e o sexo, deixando pra trás um rastro de corações partidos e decepcionados, está ficando fora de moda e pode se transformar naquele que efetivamente pode amar, que pode conquistar sem a necessidade de inventar histórias ou prometer amor eterno. Desde que permita, sem mentiras, que os envolvidos façam suas escolhas de forma consciente.
E se isso não for possível, melhor ficar atenta para não cair nessa armadilha tão démodé.
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Categorias: Segredos para ser feliz, Viver
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