Coronavírus Brasil: a tragédia que ninguém esperava, vai chegar em todos os lares


Um vírus assim distante, que começou na China e se espalhou pelo mundo com a grande ajuda de alguns tipos de pessoas: os otimistas, os conspiradores e os negacionistas.

Em uma entrevista para a BBC News Brasil, o médico oncologista Drauzio Varella revelou que ele mesmo subestimou a gravidade da situação, e também foi otimista. Ele não esteve sozinho na percepção minimizadora daquele surto que apareceu em Wuhan. Da li, imaginar uma pandemia, significava ser exageradamente catastrófico.

A Itália também subestimou o “vírus chinês”. Ninguém, por mais pessimista que fosse, poderia imaginar que a sua facilidade de contágio nos levaria à uma pandemia. Até mesmo a OMS, se quisermos ser justos, demorou para declarar pandemia.

A maioria de nós, de certa forma, preferiu não acreditar na tragédia anunciada: o vírus era letal apenas para idosos, era, na maioria dos casos, uma gripezinha. O negacionismo – a psicologia explica – faz parte de um processo de defesa pessoal insconsciente, porque, quem de nós, em sã consciência desejaria a morte de alguém por falta de ar?

Porque é isso que o médico Drauzio Varella nos lembra sobre o quadro cruel que o novo coronavírus pinta:

“Você só vai para o hospital quando você tem falta de ar. E essa falta de ar é progressiva, você tem que ter os recursos de ventilação mecânica à disposição. Se você não tiver esses recursos, o que vai acontecer? Não é que você volta para casa, sofre um pouco e passa. Não, falta de ar é o pior sintoma que existe. Porque se você tem dor, toma analgésico, você tem tosse, tem jeito de bloquear. Agora ter falta de ar é uma morte horrível. Horrível.”

A tomada de consciência

Mas se o negacionismo é uma defesa inconsciente do nosso ego que não quer aceitar que, neste momento, devemos sim mudar alguns hábitos, e restringir a nossa liberdade de ir e vir, o otimismo é um seu parente. Quem nega a gravidade da situação, pedindo, por exemplo, pelo fim do isolamento porque acredita ser forte o suficiente para enfrentar um contágio, porque é atleta, jovem, não fumante, enfim, fora do grupo de risco, ainda não tomou a consciência de que, infelizmente, não é assim que a banda do coronavírus toca: jovens saudáveis sem doenças precedentes também morrem.

Quem é rico, e tem o melhor plano de saúde, também precisa se conscientizar de que, até os ricos e bem assistidos morrem.

Além do negacionista e do otimista, tem o conspirador, que pensa que o vírus na verdade foi criado em laboratório para ser uma bomba química, ou para desequilibrar a economia mundial. Existem 1001 teorias complotistas mas o fato é que, mesmo se as teorias da conspiração se revelassem verdadeiras, é preciso ter consciência do fato que a origem do vírus não muda o seu caráter contagioso e mortal. O vírus é, neste sentido, democrático: atinge a todos: otimistas, pessimistas, complotistas, ricos e pobres. Haja vista que até Boris Johnson se contagiou.

No Brasil, recentemente, a deputada estadual Janaina Paschoal disse ter sido contagiada. Antes dela, o governador do Rio, Wilson Witzel, também.

Vai chegar em todos os lares

Citamos apenas dois políticos de duas cidades importantes do Brasil, só para termos uma ideia do quão democrático esse vírus possa ser.

Dado que passamos de uma percepção atenuadora sobre o coronavírus, talvez não fosse o caso de ir ao extremo oposto, e anunciar uma tragédia dele no Brasil. No entanto, como dizem por aí: é melhor pecar por excesso do que por falta.

Como lembra Drauzio Varella, 13 milhões de brasileiros vivem em condições precárias de habitação, “em lugares impróprios para a vida humana”, sem saneamento básico, sem renda, sem nada. Como impedir que estas pessoas se infectem? Mas elas estão nas favelas, no interior do interior do norte e do nordeste, terras que ninguém sabe que existem, ninguém se interessa por elas… Então, qual é o problema?

O problema é que estas pessoas trabalham como empregados, manicures, motoristas, babás e – apesar de muita gente não querer enxergar – suas vidas, ou mortes, importam. Importam desde o ponto de vista egoísta (pode ter te contagiado) ao econômico, passando pelo pessoal e afetivo.

O nosso passado escravagista não é passado, é presente, e é aí que, no Brasil, é muito provável que o novo coronavírus chegue em todos o lares. Não que infecte todo mundo, mas todo brasileiro vai saber de alguém que morreu por coronavírus: o tio da empregada, o filho do padeiro, o dono da quitanda e por aí vai.

Se você tem dúvidas sobre isso, basta se perguntar: quantas pessoas você conhece que já tiveram o coronavírus? Elas te parecem longe? Talvez nem tanto. Lembre-se que o vírus veio da China.

“Eu acho que vai acontecer uma tragédia nacional, eu não tenho dúvida disso. Eu acho que nós vamos ter um número muito grande de mortes”, disse Drauzio Varella – veja AQUI a entrevista completa dele, concedida à Ligia Guimarães para a BBC Brasil.

O privilégio de se proteger

O isolamento e a higienização constante das mãos são as únicas formas comprovadas de conter a disseminação do vírus. E, convenhamos, estas medidas são privilégios de poucos.

Os números, os gráficos, as notícias dão uma boa percepção do problema. Muitos se comoveram com os carros do exército carregando cadáveres na Itália, mas quando a percepção é real, porque está perto da gente, aí sim, é tragédia!

Talvez te interesse ler também:

Em SP, a imagem chocante das dezenas de covas abertas para receber as vítimas do coronavírus

Salvar vidas ou combater a recessão? Coronavírus coloca em ação a ética da economia

Morto por Covid-19 o escritor Luis Sepúlveda




Daia Florios

Cursou Ecologia na UNESP, formou-se em Direito pela UNIMEP. Estudante de Psicanálise. Fundadora e redatora-chefe de greenMe.


ASSINE NOSSA NEWSLETTER

Compartilhe suas ideias! Deixe um comentário...