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Por muito tempo era comum que os adultos casassem e tivessem filhos. Era isso o que as pessoas esperavam quando se atingia determinada idade. No entanto, a mentalidade de que todos têm que seguir o mesmo caminho foi mudando, e isso é muito bom. Ninguém deveria ser obrigado a seguir um rumo que não quer. Como, por exemplo, ter filhos. Respeitar a vontade alheia é saudável e desejado. Agora, uma pausa nesse pensamento, para inserir outro sobre o direito de ir e vir, de conviver com as diferenças, de entender que os espaços são de todos, não de alguns, selecionados.
Pois bem, existe uma corrente que defende o direito de não precisar conviver com crianças, nos espaços públicos. Os “Child Free”, inicialmente, eram pessoas que não queriam ter filhos, mas o conceito se expandiu para o desejo por uma sociedade livre das crianças. Já existem estabelecimentos, como hotéis, restaurantes e pousadas, em diversos países, que restringem a presença do público infantil como forma de atrair clientes que querem “paz” e “tranquilidade”.
Porém existe uma reflexão que precisa ser feita? É correto restringir o direito de ir e vir das crianças em nome de um desejo particular discriminatório e proibitivo?
Crianças são cidadãos. Fazem parte da sociedade. Estão em uma fase da vida – que todos passaram, por sinal, – de intenso desenvolvimento e aprendizado, e, mais do que isso, têm habilidades que adultos não costumam ter: a falta de preconceitos de qualquer espécie é uma delas. A generosidade com o próximo é outra. A criatividade e a energia são outras.
Crianças não são acessórios, são seres humanos, e precisam ser expostos ao convívio social para aprenderem justamente a conviver com todos. Somente por meio da experiência a criança é capaz de aprender a se “comportar” em público. E os pais também têm que ter o seu direito de sair e frequentar tais lugares. A partir do momento que se restringe o acesso dos filhos pequenos a determinados lugares, existe uma segregação não somente a eles, mas aos pais também, e, principalmente, às mães, que ainda são as maiores cuidadoras.
Tolerância não se aprende com proibições, mas com exposição. E isso vale para as crianças, que estão aprendendo, e para adultos, que talvez nunca tenham aprendido essa importante ferramenta social. Discriminar o outro por “incomodar” é algo que não pode, de modo algum, ser louvado, sob pena de voltarmos a uma época em que segregar determinados grupos, como negros, gays, judeus, era algo aceitável. Nunca deve ser. O outro existe e é preciso lidar com ele. O mundo em sociedade deixa de ser viável se cada um acreditar que seus desejos pessoais são mais importantes do que os coletivos.
Ademais, ambientes Child Free ainda contam com a presença de outra categoria igualmente difícil: os adultos, que podem, e geralmente são, muito mais desrespeitosos e incômodos do que as crianças. A diferença talvez seja que os adultos têm poder de se defender sozinhos, crianças não. Por isso parece fácil atacar alguém tão vulnerável. O respeito à decisão de não ter filhos é o mesmo respeito à decisão de tê-los. Por isso o discurso dos Child Free soa até contraditório. Eles querem ter a liberdade de escolha, mas querem restringir a dos outros. Não faz sentido.
Crianças devem sim aprender regras de convivência em sociedade, e os cuidadores devem ensiná-las sobre isso. Mas crianças sempre serão crianças, e podem chorar alto no restaurante por estarem cansadas, ou mesmo se atreverem a dar um sorriso bem aberto para o desconhecido da poltrona ao lado, no avião. Cabe aos pais, é claro, administrar essas “criancices” da melhor forma e educar os pequenos sobre o que é estar em comunidade. Mas essa mesma comunidade precisa ser receptiva a elas. E aceitar que elas também podem – e devem – passear, viajar, comer em restaurantes.
Tolerância é saber lidar, e não proibir. Medidas autoritárias nunca são a solução.
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