Por que as crianças veem mil vezes as mesmas coisas?


O livro já foi lido tantas vezes que as páginas já estão descolando, a capa está desbotada e a história propriamente dita já foi decorada pelos pais. No entanto, a criança segue pedindo sempre por aquela história.

Ou então, no caso daqueles desenhos animados vistos centenas de vezes, sempre com a mesma emoção e encanto. Você já parou para perguntar por que as crianças fazem as mesmas coisas tantas vezes? Querem ler o mesmo livro, assistir o mesmo filme, brincar igualzinho a primeira vez?

As crianças aprendem com a repetição. Acontece com os adultos também, mas com os pequenos esse aprendizado, por ser em ritmo acelerado e envolver conceitos que elas vão levar pela vida afora, precisa ser feito desse modo sistemático.

É por meio da repetição que a criança compreende, aprende e constrói valores e referências. Por serem muito dispersas, não conseguirem se concentrar por muito tempo em uma mesma atividade, as crianças aproveitam as repetições para “rever” “fixar” o que tinham visto antes, e também para enxergar novos detalhes, construir novos caminhos, perceber as etapas, que tudo tem começo, meio e fim.

É na repetição que as conexões neurais da criança vão se fortalecendo para formar um aprendizado profundo. É ela que reforça todos os esquemas cognitivos no cérebro infantil, ajudando ainda na consolidação da memória.

Ouvir a mesma história, cantar a mesma canção dá à criança a sensação de familiaridade. Os livros lidos, as músicas cantadas, os desenhos assistidos são todos “conhecidos”, pertencem ao mundo dela. E isso é importante, pois dá à criança a sensação de segurança, que elas tanto precisam para construir sua própria identidade.

Conforme vão crescendo, as repetições vão diminuindo. O livro lido mil vezes, passa a precisar apenas de uma centena de leituras e assim por diante. No primeiro ano, por exemplo, um bebê precisa de pelo menos mil repetições de uma mesma palavra para então começar a falar essa palavra.

Com o fortalecimento do desenvolvimento cognitivo, as repetições na linguagem vão ficando mais esparsas, até atingir a fase em que a criança fala coisas que os pais nem lembram de terem dito.

Um estudo da Universidade de Sussex mostrou como essa repetição de histórias ajuda na formação da linguagem e expressão, em uma amostra feita com crianças de 3 a 6 anos.

Quando os pais participam desse processo de repetição, lendo o livro velho, desbotado e decorado mais uma vez para a criança, eles estão ajudando a proporcionar tudo isso e mais: a leitura compartilhada fortalece o vínculo afetivo por meio da cumplicidade que se estabelece no momento.

Então, se a criança pede “mais uma vez”, você já sabe que a resposta só pode ser sim, mesmo que você já esteja cansado de ouvir o que acontece com o ursinho da história.

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Cintia Ferreira

Paulistana formada em Jornalismo pela Universidade de Santo Amaro, tem o blog Mamãe me Cria e escreve para greenMe desde 2017.


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