Apadrinhamento afetivo: o que é e como funciona


Você se lembra de uma matéria do GreenMe sobre os doadores de cafuné? Os doadores de cafuné são pessoas que dão carinho a bebês e dedicam o seu tempo a crianças que estão na fila da adoção ou que não estão temporariamente sob a guarda dos pais.

Essa dedicação é um pedido da agência norte-americana, Spence-Chapin, que trabalha para encontrar famílias para crianças carentes. O trabalho trata de conseguir voluntários para dar carinho aos pequenos.

Apadrinhamento afetivo: o que é?

Aqui no Brasil, esse tipo de doação chama-se apadrinhamento afetivo de crianças e adolescentes com poucas chances de serem adotadas. É uma oportunidade de interessados darem a essas crianças e jovens uma convivência familiar, além de receberem incentivo para estudarem. Não se trata de adoção, mas uma forma de oportunizar a crianças e jovens a vivência cotidiana com uma família.

E como funciona?

Funciona assim: a cada quinze dias, as crianças encontram-se com uma família, geralmente aos fins de semana, e fazem passeios com ela e participam dos eventos dessa família. Tanto os padrinhos quanto as crianças e os jovens recebem um preparo prévio de uma instituição especializada, segundo informa o Senado Federal.

A Frente pela Adoção tem um programa especial que oferece essa alternativa para crianças e adolescentes que têm uma chance remota de adoção, geralmente aquelas com mais de 5 anos de idade, que têm algum tipo de deficiência ou, ainda, que foram retiradas das famílias por estarem em ­situação de risco.

Segundo o site do Senado, o programa prevê que padrinhos e madrinhas passem os fins de semana, feriados e parte das férias com a criança ou adolescente para oferecer-lhe uma relação afetiva, referência de vida e oportunidades fora do abrigo, bem como amparo material.

Cada Vara de Infância determina as regras do apadrinhamento afetivo, destinado a pessoas que não podem ou não querem adotar, mas que gostariam de dar suporte financeiro e afetivo para uma criança ou adolescente abrigado. O apadrinhamento afetivo não é uma guarda, tutela ou adoção. Até empresas podem participar do programa, custeando cursos profissionalizantes, estágios, escola ou reforço escolar, atividades esportivas etc.

Adoção no Brasil

A Lei Nacional da Adoção é de 2009. Passados quase 20 anos, o governo federal quer agilizar os prazos de adoção, além de criar um sistema de apadrinhamento afetivo para facilitar a adoção de menores com irmãos mais velhos ou com doenças, segundo reportagem do Jornal de Brasília.

Hoje, no país, há o Cadastro Nacional de Adoção (CNA) e é obrigatório o curso preparatório para quem deseja adotar uma criança. Entretanto, o processo de adoção pode se arrastar por muito tempo, afastando a criança que tanto precisa de um lar daquelas pessoas que tanto querem adotar.

Em fevereiro deste ano, o Ministério da Justiça e Segurança Pública divulgou a minuta de um anteprojeto de lei que foi finalizado após meses de consulta pública. Os novos prazos passariam a ter como limite 240 dias, prorrogáveis pelo mesmo período, para a habilitação das famílias, e de 120 dias, também prorrogáveis, para a conclusão da ação.

Tal limite de tempo pode ser importante, porque, hoje, não há um prazo para ser feito o estudo psicossocial sobre os candidatos a pais adotivos, etapa da fase de habilitação. Esse estudo se baseia em entrevistas com assistentes sociais, psicólogos e juízes, etapa que costuma ser bastante lenta, podendo durar até um ano ou mais, em alguns casos.

Outro ponto do anteprojeto é dar mais celeridade aos casos de interessados em adotar grupo de irmãos, criança acima de oito anos ou com deficiência, doença crônica ou necessidades específicas de saúde. Além disso, o governo pretende rever as regras de adoção de crianças brasileiras por estrangeiros, sendo uma delas a redução do prazo mínimo de 30 dias de convivência no país para metade.

O texto precisa ser aprovado na Câmara dos Deputados e no Senado Federal antes da sanção presidencial.

Menos burocracia

Walter Gomes, supervisor da área de adoção da Vara da Infância e da Juventude, explica que a adoção não pode ser tratada como medida excepcional: “Até por conta disso tantas crianças acabam perdendo a oportunidade de serem acolhidas por famílias habilitadas. O tempo passa enquanto há tentativas frustradas de reintegração familiar. A própria lei favorece esse tipo de situação”.

Os coordenadores de instituições de acolhimento também concordam com Gomes: “A burocracia faz com que as crianças fiquem muito tempo nos abrigos. Há famílias que sabemos que não vão ficar com os meninos, apesar das tentativas de reintegração”, conta Ana Lúcia, que administra o Lar de São José, em Ceilândia, Distrito Federal.

Na opinião de Soraya Pereira, psicóloga da ONG Aconchego, o que faltam são políticas públicas mais eficazes para que a lei seja cumprida e os processos tramitem mais rapidamente, com mais pessoas no Judiciário cuidado deles.

Mas não basta mudar a lei, é preciso investir em recursos humanos

Já o professor de Direito da Família da Universidade de Brasília Carlos Tadeu de Carvalho pondera que a Justiça precisa ter certeza de que a criança ou jovem foi bem adotado. Ele afirma que a legislação brasileira sobre a adoção é uma das mais avançadas do mundo e que pode ser complicado estipular certos prazos que podem não ser cumpridos, já que cada fórum tem recursos humanos diferenciados. Carvalho defende que a lentidão dos processos não é culpa do juiz, mas da quantidade de processos acumulados, o que raramente permite que os prazos sejam cumpridos.

Por isso, não adianta mudar a lei se não houver investimento em recursos humanos.

Adoção e apadrinhamento afetivo são formas de doação sérias, pois o bem-estar da criança e do adolescente em processo de adoção deve ser sempre priorizado. É claro que a morosidade judicial dificulta o encontro dos dois lados envolvidos no processo, mas, além de maior celeridade, é preciso que os mecanismos de certificação de que a criança encontrou uma boa família sejam também eficazes. Se não, apenas a forma da lei muda, e não o seu conteúdo.

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Gisella Meneguelli

É doutora em Estudos de Linguagem, já foi professora de português e espanhol, adora ler e escrever, interessa-se pela temática ambiental e, por isso, escreve para o greenMe desde 2015.


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