Brasil, um dos países mais perigosos para jornalistas. Dia Internacional da Liberdade de Imprensa


Hoje, 3 de maio, é celebrado o Dia Internacional da Liberdade de Imprensa, entretanto, no Brasil, temos pouco a comemorar.

O Dia Mundial da Liberdade de Imprensa foi criado pela UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura), em 1993, para comemorar o direito à investigação e publicação de todos os profissionais que trabalham em meios de comunicação.

A importância da data é uma forma de reafirmar o compromisso público da comunicação social contra qualquer ato de censura. A luta pela liberdade de imprensa não é um jogo ganho, sendo necessário, sempre, fazer vigília desse direito, haja vista que a História rema por mares, às vezes, autoritários.

Em regimes notoriamente ditatoriais e, mesmo naqueles que são democráticos, a liberdade de imprensa pode ser ameaçada. Por isso, o 3 de maio visa a alertar sobre crimes cometidos contra jornalistas, os quais muitas vezes são torturados e assassinados por causa do seu exercício profissional.

Em 2018, um estudo da ONG Repórteres Sem Fronteiras divulgado pela Revista Fórum apontou que os países mais arriscados para jornalistas são Afeganistão, Síria, México, Iêmen, Índia e Estados Unidos.

Liberdade de imprensa no Brasil

A Constituição de 1988 garante o direito à liberdade de imprensa em seu artigo 5º, inciso IX, quando diz:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.

Convém lembrar que o legislador fez questão de colocar esse direito fundamental na carta constitucional a fim de que o país não corresse o risco de viver novamente sob censura, como havia ocorrido durante a ditadura militar (1964- 1985).

Entretanto, mesmo a Constituição federal prevendo a liberdade de imprensa, o Brasil ocupa um lugar vexatório no relatório divulgado pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que informa que 64 jornalistas, profissionais de imprensa e comunicadores foram mortos no exercício da profissão no Brasil entre 1995 e 2018, de acordo com matéria de Heloisa Cristaldo para a Agência Brasil.

O documento, intitulado Violência Contra Comunicadores no Brasil: um Retrato da Apuração nos Últimos 20 Anos e elaborado pelo Conselho Nacional do Ministério Público e pela Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública (Enasp), constata que:

“Hoje o Brasil é um dos países mais violentos no que diz respeito ao ambiente de atuação dos comunicadores – nos posicionamos em sexto lugar no ranking de nações mais perigosas para jornalistas, segundo a [Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura] Unesco. Estamos atrás apenas de países em manifesta crise institucional, política e até humanitária, como Síria, Iraque, Paquistão, México e Somália”.

A constatação do relatório não é uma novidade, visto que o Brasil ocupa uma posição bastante desfavorável nos estudos sobre liberdade de imprensa internacionais há vários anos. A Unesco considera o Brasil o sexto país mais perigoso do mundo para os profissionais da comunicação, já que aqui ocorre uma “verdadeira violação à liberdade de expressão”.

O documento da Unesco aponta, ainda, o despreparo do Judiciário brasileiro em lidar com os casos de violação à liberdade de expressão e ao exercício profissional, pois

“muitos dos autores intelectuais desses crimes não chegam a ser responsabilizados. A autoria por vezes sequer é identificada.”

A Unesco, inclusive, responsabiliza o Estado brasileiro por essa situação, dentro do quadro do Direito internacional:

“Essa situação de inação pode gerar a responsabilização internacional do Estado brasileiro, pela violação de compromissos internacionais voltados a proteção dos Direitos”.

Profissão de risco

A maioria dos profissionais de comunicação morre em cidades do interior, sendo que grande parte deles são blogueiros e radialistas. De acordo com o relatório, os estados que registram mais mortes desde 1995 são: Rio de Janeiro, com treze assassinatos; Bahia, com sete; e Maranhão, com seis. A maioria desses crimes ainda não foi solucionada.

Um dos pontos ressaltados pelo documento se refere aos crimes contra jornalistas no Rio de Janeiro:

“Chama atenção a quantidade de fatos ocorridos no estado do Rio de Janeiro, que lidera como a unidade da federação mais violenta para o trabalho de comunicadores”.

O ano que registrou mais casos de violência contra profissionais da imprensa foi 2015, curiosamente o ano em que houve o impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff. Em seguida, o ano de 2018 apresentou as taxas mais altas – ano eleitoral, em que houve a morte de quatro comunicadores no exercício de suas funções.

A ONG internacional Repórteres Sem Fronteiras já havia mostrado que 2018 foi um ano de eclosão de violência contra profissionais de imprensa no mundo todo – e no Brasil não foi diferente. A pesquisa alerta que a principal dificuldade na apuração desse tipo de crime está em verificar quem são os mandantes e, também, os executores.

Ser jornalista no Brasil é, praticamente, uma profissão de risco. Censura, agressão, tortura, assassinato são crimes cometidos contra os profissionais da área de comunicação no Brasil.

Tim Lopes, Santiago Andrade e tantos outros

O Blog do Sakamoto afirma que o Brasil é um dos piores lugares para um jornalista exercer sua profissão, de acordo levantamentos feitos por organizações que analisam casos desse tipo de violência – situação que piorou com as jornadas de junho de 2013, com a eleição presidencial de 2014, com o impeachment em 2015 e com a eleição presidencial de 2018.

São muitos os casos absurdos de violência contra profissionais de imprensa no Brasil para serem lembrados, dentre eles o cometido contra o jornalista Tim Lopes, em 2002, morto durante uma reportagem sobre abuso de menores e tráfico de drogas na Penha, no Rio de Janeiro. Como lembra o site da APUFPR, Tim foi sequestrado, torturado e assassinado por traficantes liderados por Elias Maluco em um ritual repleto de crueldade: o seu corpo foi esquartejado e jogado queimado num buraco, denominado pelos criminosos de microondas.

Outra morte chocante foi a do cinegrafista Santiago Andrade, atingido por um rojão disparado em uma manifestação, no Rio de Janeiro, em 2014.

Ainda segundo Sakamoto, dados da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) mostram que a maior parte dos casos de violência em manifestações, nos últimos anos, teve o envolvimento de policiais, sem que houvesse qualquer justificativa para um ato de violência, visto que os profissionais de imprensa estavam devidamente identificados. Logo, a atuação policial foi no sentido de exercer a censurar aos jornalistas e impedir a livre circulação de informações.

Liberdade de expressão e democracia

Boa parte da população brasileira ainda não entende o que significa atacar a liberdade de imprensa através da figura do jornalista. A liberdade de expressão é uma das bases da democracia. Isso não significa que as pessoas podem dizer qualquer coisa sem que sejam criticadas e responsabilizadas pelo que dizem. O que não pode ocorrer é um ataque virulento à liberdade de expressão e de opinião, algo que deveria ser repudiado por qualquer sociedade que preserva o regime democrático e pelo poder público, que tem a responsabilidade de garantir o livre exercício dos profissionais de imprensa.

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Gisella Meneguelli

É doutora em Estudos de Linguagem, já foi professora de português e espanhol, adora ler e escrever, interessa-se pela temática ambiental e, por isso, escreve para o greenMe desde 2015.


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