Violência doméstica e abuso contra homens: o que é e como acontece?


Pode parecer estranho um texto sobre violência doméstica cujas vítimas sejam homens. Ainda mais no Brasil, onde o número de mulheres que são vítimas de violência dentro de suas próprias casas é alarmante. Mas o fenômeno existe e, embora pouco conhecido, vem sendo divulgado ultimamente. Vamos saber mais sobre ele?

Violência doméstica no Brasil

Segundo dados do Ministério dos Direitos Humanos (MDH) no Brasil, referentes ao período de janeiro a julho de 2018, a partir de um balanço do Ligue 180 – Central de Atendimento à Mulher, foram registrados 27 feminicídios, 51 homicídios, 547 tentativas de feminicídios e 118 tentativas de homicídios.

No mesmo período, os relatos de violência chegaram a 79.661, sendo os maiores números referentes à violência física (37.396) e violência psicológica (26.527).

Desses relatos, 63.116 foram classificados como violência doméstica, o que inclui cárcere privado, assédio, homicídio, tráfico de pessoas, tráfico internacional de pessoas, tráfico interno de pessoas e as violências física, moral, obstétrica, patrimonial, psicológica e sexual.

Apesar de as mulheres serem as principais vítimas de violência doméstica, ela também ocorre com homens.

Violência doméstica contra homens. O que é?

Esse tipo de violência contra homens e meninos abrange uma relação íntima como o casamento, a coabitação, o namoro ou dentro de uma família. Assim como quando a vítima é uma mulher, a violência contra homens pode constituir crime.

Em geral, os casos de violência, quaisquer sejam as vítimas, costumam ser subnotificados. E no caso dos homens também, uma vez que o próprio machismo faz deles algozes e vítimas. Pelo estigma da masculinidade, a violência conjugal abusiva é muitas vezes mascarada por eles.

No Brasil, não há estatísticas oficiais de violência doméstica contra os homens, o que coloca o problema e as vítimas em invisibilidade. O silêncio social de muitos homens se deve à vergonha dos amigos, familiares e até mesmo de profissionais da saúde, tornando o problema um tabu.

Alguns dados sobre este tipo de violência

O Centro Latino-Americano de Estudos de Violência e Saúde Jorge Careli (Claves) da Fundação Oswaldo Cruz realizou um estudo sobre agressões no namoro com 3.200 estudantes de 104 escolas públicas e particulares, em 10 estados.

A pesquisa revelou que 9 em cada 10 adolescentes praticam ou sofrem violência no namoro; 30% das meninas agridem fisicamente o namorado (tapa, puxar cabelo, empurrar, desferir soco e chute); 17% dos meninos agridem, conforme informa o site Canal Ciências Criminais.

No Reino Unido, em 2017, um estudo pioneiro com 200 homens que sofreram abusos sexuais cometidos por mulheres, mostrou que 80% dos homens nunca relataram as ocorrências e 74,5% não buscaram apoio.

Como no Brasil não há dados oficiais sobre esse tipo de violência conjugal, um questionário no Google Forms foi disponibilizado em redes sociais (páginas e grupos do facebook), para o público masculino responder. A Revista Eletrônica Âmbito Jurídico analisou os dados de 833 homens respondentes sobre as seguintes perguntas:

1. Já sofreu algum tipo de violência nas relações íntimas de afeto? 63,6% sim (521 pessoas); 15,6% talvez (128 pessoas) e 20,8% não (170 pessoas)

2. Justifica tudo o que faz, e quando se esquece ou não tem tempo, ocorrem brigas? (ou já passou por isso em algum relacionamento?) 78,6% sim (629) e 23,3% não (190)

3. Não pode estar com amigos ou sua família porque ela tem ciúmes? (ou já passou por isso em algum relacionamento?) 63% sim (516) e 37% não (303)

4. A mesma mulher praticou mais de uma dessas condutas e em momentos diversos? 81,4% sim (667) e 18,6% não (152)

5. Pode relatar o que sentiu após a violência sofrida, praticada ou retribuída? Fora recebido só no espaço aberto do questionário, 464 relatos, além de outros em redes sociais.

O questionário revelou que os próprios homens têm dificuldade para identificar a violência afetiva – na primeira pergunta 63,6% (521) disseram que sofreram violência afetiva e, ao final do questionário, o número subiu para 75,3% (615).

Casos verídicos

Uma matéria publicada na BBC relatou a experiência de um jovem britânico que sofreu grave violência por parte de sua ex-namorada. Alex Skeel, de 22 anos, deu um depoimento à jornalista Sophie Haydock, da BBC Three, relatando que a sua companheira jogou água fervendo sobre ele, resultando em queimaduras de terceiro grau.

Segundo o relato do jovem, no início do namoro, que durou três anos, a namorada começou os abusos com pequenos gestos, como dizendo a ele para não usar a cor cinza ou que não gostou do seu penteado, até chegar ao abuso físico.

Skeel conta que a relação se resumia a jogos mentais e que a companheira queria controlar todos os aspectos da vida dele. Ela foi a primeira mulher presa, no Reino Unido, por comportamento coercitivo e controlador.

Dados do Crime Survey para Inglaterra e País de Gales mostram que, em 2017, cerca de 2 milhões de adultos com idades entre 16 e 59 anos sofreram abusos domésticos – desse total, cerca de um terço é composto por homens.

femme battant mariFemme battant son mari“; Albrecht Dürer, pintor renascentista

Como reconhecer um relacionamento abusivo

Em uma relação abusiva predomina o excesso de poder sobre o outro.

Como informa o Repórter Unesp, alguns sinais podem indicar se você está em um relacionamento abusivo, tais como:

  • ciúme e possessividade exagerados;
  • controle sob as decisões e ações do parceiro;
  • querer isolar o parceiro até mesmo do convívio com amigos e familiares;
  • ser violento verbalmente e/ou fisicamente;
  • e pressionar ou obrigar o parceiro a ter relações sexuais.
Mesmo que qualquer pessoa, de qualquer gênero, possa vir a ser vítima de uma relação abusiva, de acordo com a psicóloga Raquel Silva Barretto, as principais vítimas, no Brasil, são as mulheres jovens.

Independentemente do gênero, quem está em um relacionamento abusivo deve pedir ajuda psicológica especializada e contar com o apoio de amigos, familiares ou grupos específicos.

A violência, psicológica ou física que seja, e contra quem quer que seja, constitui crime.

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Gisella Meneguelli

É doutora em Estudos de Linguagem, já foi professora de português e espanhol, adora ler e escrever, interessa-se pela temática ambiental e, por isso, escreve para o greenMe desde 2015.


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