A barragem rompeu no dia 5 de novembro de 2015 – acabou tudo, não sobrou nada. Povoados foram arrasados, gente morreu engolida pela lama da mineradora, bichos morreram embrulhados em lama, as terras ficaram estéreis, cobertas de lama. E a água, boa, do Rio Doce, da bacia inteira, ficou contaminada. A lama, tóxica de muitos químicos, lá está, até hoje.
Esse documentário conta as perdas – uma vida você não traz de volta, diz a moradora. Uma vida, a vida, quando se perde, é perda total, não tem jeito. E lá, em Mariana, onde arrebentou a barragem do Fundão, da empresa Samarco de Mineração, não sobrou vida por onde a lama passou.
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No rastro da lama, 60 milhões de metros cúbicos, foi-se para o “brejo” a histórica cidade de Mariana, 17 vidas humanas, centenas de desabrigados, toda a biodiversidade que habitava a calha dos rios engolidos pela lama, de mineração.
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A lama percorreu 550 quilômetros do Rio Doce, e alguns afluentes, chegou ao mar, no Espírito Santo, matou tudo, consumiu a vida, derrubou casas, matou peixes, moluscos, animais, invadiu as ondas que, antes verdes, hoje são marrons e pesadas, de lama.
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Histórias de desolação, é o que conta o documentário “Rio Doce – Histórias de uma tragédia”, um longa metragem dirigido por Pedro Serra, jornalista e Hermano Beaumont, roteirista, com o produtor mineiro Diego Sales e com os cinegrafistas Alexandre Salem e Átila Ximenes. As filmagens e recolha de material foram realizadas em duas fases distintas, uma em novembro de 2015, logo que ocorreu o rompimento da barragem e a segunda, 6 meses depois, quando foram revisitadas as pessoas e lugares da primeira. A lama já tinha chegado ao litoral do Espírito Santo nesta época, o Rio Doce já estava agonizando (tecnicamente, estava morto).
As histórias são contadas pelos que as sofreram, e ainda sofrem suas consequências, pois a tragédia continua e, seus efeitos demorarão muitos anos para serem minimizados sequer.
Alguns dos relatos do documentário estão aqui, no site do documentário, e outros, na página “Humanos do Rio Doce”. Leia aqui o relato de Jaqueline Fernandes, moradora de Mariana, que perdeu um irmão, trabalhador terceirizado da Samarco, na tragédia:
“Eu vi muita gente da Samarco chegando assustada no bar onde eu trabalho, perto da barragem. Eu fiquei sem chão quando um senhor me disse que tinha visto os seus amigos morrendo.Meu irmão estava bem próximo da barragem. Tentaram esconder isso da gente, mas eu fui sondando e perguntando e descobri que o meu irmão foi uma das primeiras pessoas a ser atingida. Ele estava dando uma manutenção e, quando ouviu o barulho, alguém ainda conseguiu entrar em contato e disse: ‘corre Mateus, porque a barragem estourou’. Aí disseram que ele só respondeu “ok”, e ninguém soube mais dar notícia. A Samarco só apareceu aqui na terça-feira. Aí perguntou se a gente precisava de alguma coisa. Disse que a gente precisava de ajuda sim, até psicológica, por causa da minha mãe, que está muito mal, e do meu sobrinho, que é apenas uma criancinha de cinco anos. Veio um rapaz, conversou com o meu sobrinho, depois uma senhora disse que viria na quinta, mas ninguém nunca mais apareceu.A Samarco deve estar achando que os funcionários não têm família, mas o meu irmão tem família sim.”
O filme, de 1h30 de duração, estreará em outubro, em dois lugares. Nas praças públicas de Mariana, MG, e Regência, ES e, a campanha do Kickante pede sua contribuição para ajudar nos gastos.
Veja o teaser do documentário, vale a pena:
Até 1º de Setembro o valor do projeto deverá estar completo (55 mil reais). Veja os detalhes do orçamento na página do Kickante e, se puder e quiser, contribua aqui.
É importante que não se esqueça, é importante que os responsáveis pela tragédia sejam, realmente, levados à justiça, é importante que as vítimas, todas, sejam recompensadas pelos danos sofridos e que a natureza seja recuperada, de verdade, por projetos sérios e consequentes. E, por isso, é importante que este documentário seja divulgado, para que não sejam esquecidas as histórias dos que sofreram com a lama da Samarco na Bacia do Rio Doce.
UATU, O RIO DOCE DO POVO KRENAK, UM RIO DE VIDA QUE MORRE
Fonte foto capa: DW
Categorias: Arte e Cultura, Viver
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