Estive pensando neste assunto, na arte de resolver problemas que nós, mulheres, aprendemos com a vida. E me lembrei que, quando a gente borda, tece, faz trico ou crochê, em cada ponto dado está entrelaçado um pensamento.
Você já pensou nisso? Na capacidade que as mulheres têm de resolverem problemas e a sua relação com a herança das rendas, bordados, tricôs, etc… enfim, tudo o que cruza linhas?
Bom, teve uma época que minha irmã Isa e eu fazíamos bordados em ponto-cruz – toalhas com barra, toalhas de mesa, quadrinhos coloridos – e enquanto bordávamos, juntas e conversando, também íamos resolvendo e decidindo, liberando uma série de nós internos. Minha irmã é mais bordadeira que eu. Ela faz tapetes (Arraiolos e de outros tipos) e tapeçarias com lãs multicoloridas, coisas lindas que ainda estão pelas nossas casas, apesar dos anos que já se passaram. Sempre fizemos tricô também – essa é uma herança da nossa avó Maria. Blusas de frio, cachecóis e gorros preenchiam as tardes de inverno e até os momentos, no ônibus, de ir para a escola (claro, o ônibus, naquele tempo, não era lotado e dava para tricotar sem problemas).
Bordado da Ilha da Madeira
Mas, a questão aqui é que, enquanto a gente cruza linhas, amarra 3 fios, dá um nozinho especial, segue um desenho, riscado ou imaginado, desbasta um pano para criar espaços livres, ou preenche espaços livres com as cores que escolhemos, enfim, o nosso cérebro também cruza coisas lá dentro. E, se o cérebro cruza as mensagens, imagens e ideias enquanto a gente tece, borda ou tricota, pode ser isso ajude na tomada de decisões, não?
Renda de Bilros
Porquê, você sabe, resolver um problema é uma ação complexa pois nos obriga a destrinchar raízes e razões, abrir espaços para possibilidades de soluções, criar e abrir caminhos que modifiquem uma situação que até nos parecia, antes do começo desta ação, estagnada. É um processo bastante complexo, a gente sabe. E também sabemos que as mulheres têm “aquela mania de fazer um monte de coisas ao mesmo tempo”: fazer a comida pensando na roupa, lavar a louça pensando nas dificuldades do filho ou do marido, acordar cedo, levantar as crianças, se arrumar enquanto faz o café, leite com aveia para o pimpolho, comer, comeu, vai para o carro, ufa, que trânsito, ah, afinal deu tempo.
Adeus, meu amor, boa escola, mamãe vai trabalhar, te pega de tarde, sim, não se preocupe, não vou esquecer do caderno que você precisa. Cruzes, e aí a gente sai correndo, entra na empresa, respira fundo, se enfronha no trabalho profissional (sim, porque toda e qualquer mulher é profissional de alguma coisa, mesmo que seja de limpar nariz de filho, fazer comida, esqueci a roupa na lavadoura, xiiiii, vai chover, corre para o varal). É o mesmo ritmo que temos na empresa ou em casa, e a mesma atribulação de ações e pensamentos.
Tear andino
Bem que a gente tenta programar o dia, como se programa um bordado – fazer o risco, definir as cores de preenchimento – mas, nem sempre dá certo pois são muitas “alternativas” que aparecem pelo meio do caminho. Solicitações, não é?
Mas, quando a gente trabalha com ponto-cruz, você sabe, é um ir e vir sobre um mesmo quadradinho, vai e volta tantas vezes quantas as necessárias para que o motivo fique completo. E igual, no direito e no avesso, esta é a regra que veio da minha avó.
Pense nisso, quem sabe vai te ajudar a melhorar a “performance” de resolutora de problemas, o que todas nós somos, fazer um bordado de vez em quando.
É mais ou menos como trançar os cabelos para “trabalhar as tristezas” como se conta naquele conto mexicano. Enfim, ensina o conto que a gente deve trançar os cabelos antes de dormir e, em cada pedaço da trança, enfiar uma das tristezas do dia. No dia seguinte, as tristezas trançadas estarão pálidas e terão perdido seu impacto e importância. E, afinal, o trançar os cabelos é ou não é “tecer um fio”?Sempre gostei desse conto e da filosofia que expressa.
Fotografia tirada na Nicarágua por Candelaria Rivera, do ensaio fotográfico: “Amor de Campo”
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Categorias: Arte e Cultura, Viver
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