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Há um ano, em 25 de janeiro, ficamos estarrecidos com mais um crime ambiental no Brasil.
Dessa vez, a cidade de Brumadinho foi invadida por um mar de lama provocado pelo rompimento de uma barragem controlada pela mineradora Vale.
O desastre social e ambiental que deixou cerca de 250 mortos, 11 desaparecidos, comunidades destruídas, vegetações arrasadas e o Rio Paraopeba poluído está longe de ter um desfecho justo para as vítimas e para a sociedade.
Pesquisadores acabam de publicar um relatório inédito sobre a cartografia do desastre. O documento apresenta o percurso feito por pesquisadores desde Felixlândia até a chegada na barragem em Brumadinho, ou seja, o sentido oposto ao do desastre. Eles fizeram uma reconstrução geográfica antes, durante e após o caminho da lama. Foram 300 km percorridos e 25 pessoas entrevistadas – entre elas, moradores, comerciantes, terceirizados ligados a Vale e voluntários.
O relatório “Minas de Lama” foi produzido a partir de uma parceria entre pesquisadores do Departamento de Geociências da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF); do Instituto Federal do Norte de Minas Gerais – Campus Almenara; e Universidade Estadual de Goiás (UEG).
O coordenador da expedição, o professor Miguel Fernandes Felippe, conta que um ponto comum observado nos relatos é que os moradores das áreas rurais receberam um tratamento diferenciado em relação às formas de ação e comunicação do poder público.
“Quando se fala em população urbana, aí muda-se a história. Parece que quem mora na roça, o campesino, o agricultor, não tem a mesma importância de quem mora na cidade. Infelizmente, é o que vemos, tanto no rio Doce, quanto no rio Paraopeba”, diz o pesquisador sobre as ações da Vale e dos órgãos públicos terem diferentes escalas junto aos territórios atingidos.
Conforme informou a Radio Agência Nacional, a razão pela qual os indiciamentos demoraram a ocorrer, segundo o delegado Luiz Augusto Pessoa Nogueira, chefe das investigações, é que ainda está em curso uma perícia de alta complexidade em parceria com universidades em Barcelona (Espanha) e Porto (Portugal).
Outras 40 perícias já foram realizadas, mas nenhuma identificou o que poderia ter causado a desestabilização da barragem.
Em 2019, 13 pessoas foram indiciadas por falsidade ideológica e uso de documentos falsos, sendo que sete eram empregados da Vale e os demais da Consultoria Tüv Süd, empresa alemã que deu os laudos de que a barragem era estável.
Dentre os supostos responsáveis pelo acidente ambiental e social provocado pela Vale está o ex-presidente da empresa, Fabio Schvartsman, denunciado por homicídio doloso duplamente qualificado, isto é, quando há intenção de cometer o crime, além da acusação de crimes ambientais.
Mais outras 15 pessoas foram indiciadas pelos mesmos tipos de crime, de acordo com El Pais. A denúncia do Ministério Público de Minas Gerais atingiu onze funcionários da Vale e cinco da Tüv Süd.
Representantes de órgãos policiais e de fiscalização disseram, em coletiva de imprensa, que o crime não ocorreu somente em 25 de janeiro, quando a barragem I da Mina do Feijão rompeu, mas que ele vem sendo cometido desde novembro de 2017, visto que as empresas promoveram uma “gestão de risco”, na avaliação de William Garcia, promotor de Brumadinho.
A denúncia argumenta que a Vale funcionava como uma “ditadura corporativa”, por colocar em risco a sociedade e impedir o poder público de fiscalizar a sua atividade pela omissão de informações.
“A Vale, com o apoio da Tüv Süd, produziu um acervo interno sobre a barragem I e outras diversas barragens que eram reconhecidas internamente como barragens em situação de risco inaceitável”, expõe o promotor.
Ambas as empresas agiram em complô, visto que a Tüv Süd, responsável pela auditoria e pelos laudos, cedeu à pressão da Vale, recebendo recompensas financeiras pelo trabalho de omissão de riscos. Garcia afirma que há provas consistentes de que a Vale coagia empresas de auditoria externa que não aceitavam fazer esse tipo de serviço, que acabou sendo executado pela empresa alemã.
“Dessa forma, dentre outras tarefas executadas, foram emitidas declarações de condições de estabilidade falsas, que tinham como objetivo servir de escudo para as atividades arriscadas da Vale”, afirma William, conforme noticiado por El Pais.
A Vale, em nota, defendeu-se dizendo estar perplexa com a denúncia do MP e que seguirá contribuindo com as autoridades.
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Categorias: Ambiente, Informar-se
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