Ontem Clarice Lispector teria feito 100 anos. Nascida em 10 de dezembro de 1920, Clarice, a esfinge humana, é a escritora brasileira mais traduzida no mundo. Homenagens à ela são sempre atuais, ontem, hoje e sempre, independente do centenário. E a nossa homenagem é…
Quando tudo dá errado na tua vida, lembra da Clarice.
Os detalhes tristes (de cortar os pulsos) sobre a vida dela, podem ser prazerosamente lidos no livro Clarice, do premiado Benjamim Moser, uma biografia que contém muito da história do Brasil também.
Muito resumidamente, Clarice, filha de imigrantes ucranianos refugiados da guerra, chega ao Brasil após uma odisseia de catástrofes e sofrimentos. Sua mãe, depois de ter sido estuprada por um grupo de soldados, pega sífilis. Algum tempo depois ela engravida de Clarice (sua 3ª filha) acreditando que o nascimento do bebê curaria a doença. Clarice cresceu com o amargor de não ter sido capaz de salvar sua mãe da sífilis, a doença que a matou.
A desgraça, a pobreza, o preconceito contra os judeus, tudo na vida dela foi sofrimento, embora tenha se casado com um diplomata e tenha conhecido o mundo, mudando de casa de lá pra cá, o que Clarice sentiu na vida foi muita solidão.
Ela teve dois filhos, um deles, uma criança super inteligente que, a um certo ponto, foi diagnosticada com esquizofrenia.
Entre os baixos e baixos de sua vida, quando finalmente um amor poderia curá-la, Clarice se apaixonou, depois de separada, por um homem casado, o poeta Paulo Mendes Campos, que não deixou seu casamento por ela, e voltou para sua esposa no auge da paixão.
A vida é um soco no estômago e por isso a Clarice é a anticura que cura, como bem diz a psicanalista Maria Homem, que escreveu uma tese sobre a escritora.
Quando tudo dá errado lembre-se da Felicidade Clandestina da Clarice – no conto, uma menina espera dia após dia por um livro em uma angústia de vomitar. Lembre-se da Mulher que matou os peixes, do Ovo e a Galinha, da Paixão segundo GH…. Em todas, todas, as histórias da Clarice tem angústia, desespero, tristeza, sensação de vazio e solidão. E não só os humanos: os peixes, as galinhas, o prédio que rui na paixão de GH… tudo é dor, mas uma dor que acolhe e não recusa.
Quando tudo dá errado, lembra da Clarice porque a vida é isso mesmo, é sofrimento que pensamento positivo não cura. Só a Clarice cura ou quem quer que te diga, na lata, que sim, às vezes tudo dá errado mesmo e a vontade de viver não existe. Mas este sentimento é humano, tão humano que, ler Clarice é um alívio. “Alguém me entende”, alguém que morreu, e até viveu morta por dentro, mas que está aqui para mostrar que a vida é um, dois, 10 milhões de socos no estômago. Não tem Deus, não tem cura, tem apenas a resiliência e a sobrevivência.
Talvez o milésimo soco doa menos que o primeiro. Se é verdade que não há crescimento sem dor, é por isso que Clarice é gigante.
Para finalizar, recomendamos assistir o vídeo da Maria Homem. Entre as tantas homenagens à Clarice, ficamos com a dor do eterno crescimento.
https://youtu.be/UQNtNas-qPg
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Categorias: Arte e Cultura
Publicado em 18/12/2020 às 10:51 am [+]
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