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Você não sabia, mas alguns alimentos que consumimos são coquetéis de aditivos químicos. Segundo um estudo da nutricionista Vanessa Montera, quatro em cada cinco dos quase 9,9 mil alimentos pesquisados tinham ao menos um aditivo entre os ingredientes.
Este estudo foi o primeiro feito nessa escala no Brasil, e os números encontrados dessas substâncias nos alimentos foram recordes. O que chamou mais atenção de Montera foi o uso intensivo de aditivos cosméticos, que mudam o sabor, o aroma e a forma dos alimentos.
Muitas frutas e legumes às vezes ficam irreconhecíveis de tantos produtos químicos aplicados (corantes, saborizantes, aromatizantes, emulsificantes, entre outros), como se passassem por uma “maquiagem dos alimentos“.
Os aditivos são qualquer ingrediente adicionado ao alimento sem características e propósitos de nutrição.
Características
dos produtos são alteradas durante o processo de fabricação, processamento, preparação, tratamento, embalagem, acondicionamento, armazenagem, transporte ou manipulação.
Os aditivos sintéticos são perigosos à saúde e muitos desses ingredientes não são informados de forma clara nos rótulos dos produtos. Quando a presença de aditivos é muito frequente nos alimentos, funciona como indicativo de que ele é ultraprocessado.
A ANVISA regula o uso de aditivos e estabelece níveis máximos de consumo diário por pessoa. Alguns nutricionistas afirmam que talvez este limites estabelecidos não sejam realmente seguros para a saúde, pois estamos comendo mais alimentos ultraprocessados, ou seja, com aditivos químicos.
O trabalho de Vanessa Montera foi publicado no periódico Food and Function, da Sociedade Real de Química do Reino Unido.
De acordo com o estudo, 80 % dos produtos analisados tinham ao menos um aditivo e 25 % tinham seis aditivos ou mais.
Sua análise contou com a visita em supermercados para analisar os alimentos de dez lojas das cinco maiores redes do país em duas cidades, Salvador e São Paulo.
Todos os produtos embalados tiveram seus rótulos fotografados. De cerca de 14 mil itens, foram excluídos os que estavam duplicados, as águas engarrafadas e aqueles que não tinham informações nutricionais nas embalagens.
Restaram 9.856 alimentos, que foram divididos em 25 categorias. Em seguida, foram verificados os ingredientes de cada um deles. A cientista concluiu que 79,4 % tinham ao menos um aditivo.
A minoria dos alimentos (11,6 %) tinha um aditivo só, enquanto 19,8 % tinham dois ou três, 23,2 % tinham quatro ou cinco e 24,8 %, isso quer dizer que, a maioria tinha seis ou mais aditivos.
Os produtos com mais aditivos foram as bebidas de frutas saborizadas (com teor de suco abaixo de 30 % e pós e concentrados para preparo de refrescos). Nesses produtos, os aditivos representavam 79,7 % do número total de ingredientes listados.
Também se destacaram refrigerantes (74,5 %), outras bebidas (57,3 %), como aquelas à base de soja, chás prontos para consumo, bebidas para desportistas, leite de coco, produtos lácteos não adoçados (51,1 %), néctares (49,7 %), produtos lácteos adoçados (45,6 %) e doces e sobremesas (45,4 %).
Entre os cinco aditivos mais usados, quatro eram do tipo cosmético, a exceção foram os conservantes, que fazem com que os alimentos durem mais tempo.
Os aromatizantes, que dão cheiro a um produto, foram o aditivo mais comum. Estavam em 47,1 % dos produtos.
Depois, vieram os conservantes (28,9 %), os corantes (27,8 %, dão cor à comida), os estabilizantes (27,6% mantêm a dispersão de componentes) e os emulsificantes (19,4 %, mantêm uma mistura).
A nutricionista Montera alerta sobre o abuso da indústria de alimentos na quantidade destes ingredientes na comida:
“Os conservadores têm um propósito, porque a indústria precisa fazer com que esses produtos possam ficar mais tempo na prateleira, mas os aditivos cosméticos só servem para deixar o pão mais fofinho, fazer o iogurte ficar rosa, deixar o creme de leite mais branco. Seu único propósito é tornar o produto mais atraente para o consumidor e, por isso, não são estritamente necessários”.
Segundo a Anvisa, as substâncias são avaliadas caso a caso e o fabricante precisa comprovar que elas são seguras, necessárias e que o consumo médio esperado não traz perigos.
Mas para os nutricionistas só essa fiscalização não é o suficiente. Um dos problemas apontados é que os limites diários determinados pela agência levam em conta a ingestão de um aditivo individualmente e determinam o quanto pode ser usado em um único produto.
O consumo de aditivos está associado aos alimentos ultra-processados. Isso significa que é fácil ingerir aditivos, pois a maioria deles está presente nestes alimentos.
Daniela Canella, pesquisadora do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da Universidade de São Paulo (Nupens-USP) explica que a lei brasileira não exige que o rótulo informe a quantidade de aditivos usada em cada produto.
“Não temos como saber o quanto estamos comendo. A indústria diz que isso é segredo industrial e que não revela para que os concorrentes copiem seus produtos, mas isso significa que a gente desconhece o quanto a gente consome de aditivo no Brasil”.
A ciência ainda não sabe informar sobre se os aditivos causam ou não prejuízos à saúde. Estudos apontam que o consumo de aditivos pode estar ligado a:
Mas a indústria de alimentos diz que os aditivos são importantes para garantir a segurança e o valor nutricional dos alimentos e que não há por que se preocupar.
A Associação Brasileira da Indústria e Comércio de Ingredientes e Aditivos para Alimentos disse que o número de aditivos na composição de um produto “não tem nenhuma relação” com o alimento ser saudável ou não. Também afirma que os aditivos são usados em “pouquíssimas quantidades” e controlados rigorosamente.
O estudo de Montera comprova o contrário.
A pesquisa da brasileira Vanessa foi comparada com outro na França e a preocupação simplesmente aumentou.
O levantamento com 126 mil produtos alimentícios disponíveis nos supermercados franceses apontou que 53,8 % tinham aditivos e 11,3 % tinham cinco ou mais aditivos, bem abaixo dos índices encontrados no estudo brasileiro.
A nutricionista afirma ainda que, se a amostra do estudo nacional fosse tão grande quanto a da pesquisa francesa, os resultados poderiam ser ainda piores. Segundo ela, a Europa tem maior controle sobre o uso de aditivos alimentares e mostra que os produtos que estão sendo vendidos no Brasil tem a qualidade muito inferior do que os dos europeus.
Ter mais aditivos é sinal de pior qualidade porque essas substâncias são usadas muitas vezes para substituir ingredientes naturais.
Cabe ao governo brasileiro exigir padrões de qualidade melhores das fabricantes de alimentos. Os rótulos também precisam informar melhor sobre esses ingredientes, indicando sua quantidade.
Está prevista na agenda da Anvisa para o período entre 2021 e 2023 a modernização das regras e procedimentos para autorização do uso dos aditivos em alimentos.
Enquanto a mudança não acontece, o jeito é dar uma olhada nos rótulos dos alimentos e tentar consumir os mais naturais possíveis. Acompanhe a reportagem:
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Categorias: Alimentação
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